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"Era um fantasma abstrato entre almas concretas”. (página 74) 

Penúltimo dos filhos de Vitória, Germano é um emburrado da vida, no auge da desarmonia dos 16 anos. Desprendido da família já que, uma vez pedido o posto de caçula dos irmãos para Cassilda, tornou-se secundário nos mimos dos mais velhos e na atenção da mãe. Por esse motivo que não sofre ao partir, ainda no início da chuva, o que muitas vezes depois calcula como sendo sua boa sorte, ter fugido daquele dilúvio quando ainda era possível. Germano opera na quietude de seu corpo, por detrás do murado de sua personalidade. É um pensador, deveras, por mais clichê que isso soe, já que tem suas tardes todas para deleite próprio. É um curioso, aliás, que quando parte leva consigo alguns dos maiores mistérios de sua vida para desvendar. Entre estes um objeto amarelo que julga ser um tabuleiro de jogo antigo, guardado anteriormente no baú de pertences e lembranças da mãe, que chama "A caixa vital de Vitória". Leva-o por curiosidade, ele diria, mas talvez o faça para ter onde apoiar a saudade que virá após a partida, que não à toa se incomoda pela falta de olhares da mãe.
É inteligente como só e tem um tanto de sorte, que sem um ou outro não passaria tão batido pela longa caminhada no deserto que enfrenta. Descoberto o que diz respeito ao "tabuleiro", motivo de colóquios nas várias paradas de sua andança e desculpa também para continuá-la, parte noutra jornada, que uma vez aprendido a ser do deserto, o seria para sempre. "Todo lado é lado se não aponta para Bazalta", ele diria. Talvez por querer dizer-se forte a si mesmo que evita as faltas, pensa na mãe e nos irmãos como os coitados que não aproveitaram a chance de ir embora quando a chuva era nova. Talvez mortos, por vezes imaginava, para convencer-se de que volta não tinha. Sem saber, sua ida decidia não só o próprio destino como o de Glória, que partiu a seu encalço no dia da fuga, e o de Baltazar. Decidir destinos, na verdade, tornar-se-ia o quê de sua existência após aquela manhã de quarta-feira chuvosa em que partiu para ser família de si mesmo. O destino dos outros seria seu destino. Germano, o pequeno fantasma da casa da família Manarca viria a ser, então, o sujeito de uma história da qual ele mesmo duvidava.

Germano Manarca

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